quinta-feira, 30 de julho de 2020

É preciso discutir regresso dos serviços de resíduos e limpeza à Câmara

Maiambiente está a resvalar com resultados negativos 
A CDU desafiou a maioria que tem governado a Câmara Municipal a discutir o regresso dos serviços públicos de recolha de resíduos e de limpeza urbana à gestão directa do Município, em vez de manter a empresa municipal Maiambiente, tendo votado contra os novos contratos para a transferência de verbas na sessão desta quinta-feira da Assembleia Municipal.



Intervenções de Alfredo Maia

Sobre o contrato de gestão delegada de resíduos 

Há praticamente um mês, na sessão desta Assembleia de 29 de Junho, a CDU teve ocasião de, discutindo os resultados negativos, em quase um milhão de euros, da Maiambiente, instar o Senhor Presidente da Câmara Municipal a explicar em que consistiam e que caminho seguiam as propostas que o presidente do Conselho de Administração da empresa municipal podia e devia fazer.

Nessa ocasião, como é aliás frequente, o Senhor Presidente remeteu-se ao silêncio, reforçando a nossa convicção de que, sempre que pode, o Executivo furta-se olimpicamente ao escrutínio desta Assembleia e de que o modelo institucional de empresa municipal para a prestação de efectivos serviços públicos constitui uma escapatória muito conveniente para antepor ao genuíno controlo democrático da gestão da coisa pública.

Vem agora o Executivo pedir o que fatalmente teria de propor, insistindo neste mesmo modelo – um novo contrato de delegação de competências e de poderes de autoridade em matéria de gestão de resíduos sólidos urbanos.

A revisão dos termos do contrato tem apenas um fito: evitar que Maiambiente, que provavelmente registaria resultados negativos em 2020, pelo segundo ano consecutivo, entre na rampa descendente em direcção à dissolução da empresa, como impõe o Art.º 62.º, n.º 1, al. d) do Regime Jurídico da Actividade Empresarial Local e das Participações Locais.

Para alcançar esse desiderato, tudo foi preparado para consagrar no contrato de gestão a sua eficácia retroactiva a 1 de janeiro do corrente ano, ao abrigo do qual o Município entregará à empresa um subsídio anual à exploração no montante global de cerca de 2,8 milhões de euros, a perfazer entre 2020 e 2024 (Cl.ª 7.ª).

No entanto, não estão previstas outras transferências entre 2025 e o termo do contrato, em 2029, ausência que não é apenas a CDU a estranhar. O próprio Fiscal Único escreve no Parecer prévio sobre o contrato:

“Dado que frequentemente os acontecimentos futuros não ocorrem da forma esperada, devemos, contudo, advertir que os resultados reais poderão vir a ser diferentes dos previstos (…) e as variações poderão ser materialmente relevantes.”

Note-se que o estudo de viabilidade não prevê os investimentos necessários nos quinquénios seguintes, para além dos 3,8 milhões de euros destinado apenas a substituições.

Argumenta a proposta do Executivo, no corolário da documentação que a suporta, que “uma eventual dissolução da Maiambiente acarretaria difíceis constrangimentos para o Município (…) quer porque não possui recursos humanos necessários para o efeito, quer porque a gestão de tais serviços assume particularidades que não são susceptíveis de serem integradas e assimiladas instantaneamente pelos serviços do Município”.

Pois onde o Executivo vê um drama, a CDU encontra uma oportunidade. Ao contrário do que pretende fazer crer a maioria, a solução empresarial não é garantidamente a solução “mais eficaz e mais eficiente” para a gestão dos resíduos urbanos.

Uma análise ao Relatório Anual dos Serviços de Águas e Resíduos de 2019 (dados de 2018) deixa-nos porém com muitas dúvidas, quando analisamos indicadores como o encargo médio das entidades gestoras com a gestão de resíduos em baixa.

No país (255 entidades), esse encargo médio é de 52,56 euros por tonelada, enquanto o custo suportado nas 237 entidades de gestão directa (câmaras e serviços municipais/municipalizados, que aliás servem 87% da população) é de 49,55 €/t.

Já no caso das 18 entidades de gestão delegada (empresas municipais ou intermunicipais), como é o caso da Maiambiente, o encargo médio é de 92,18 €/t, ou seja, 86% mais pesado do que o suportado pelas câmaras ou serviços.

Mas veja-se o caso da Maia: ainda segundo os dados do RASARP 2019, o encargo médio da Maiambiente com a gestão de resíduos foi de 117,55 €/t, isto é, 137% mais caro do que o serviço prestado directamente pelos municípios.

Já agora, breves notas sobre um indicador que alguns reputam de grande importância – a cobertura dos custos do serviço.

A Maiambiente não esteve na frente do ranking: ficou em 37.º lugar, com uma cobertura de 98%, atrás de muitas câmaras que conseguiram mais de 100%, mais de 120 e até mais de 140%... 
É por demais evidente que a Maiambiente necessita de recursos do Município e por isso o Executivo veio a esta Assembleia pedir o suporte legal para uma sucessão de transferências financeiras por cinco anos, para já.

Mas o que deveríamos estar a discutir e a preparar desde já é o regresso do serviço à gestão directa do Município, preparando atempadamente a transferência dos trabalhadores e do património da Maiambiente, com a adaptação das suas estruturas a serviço municipal.


Sobre o contrato programa de limpeza pública


Numa síntese não forçada, poderemos dizer que, no essencial, a proposta de Contrato-Programa – Limpeza Pública com a “Maiambiente, E.M.”, se limita a pretender o suporte do Município para salvar a empresa, tal é a semelhança do argumentário e a extensão do decalque da fundamentação da proposta de contrato de gestão delegada de resíduos discutida no ponto anterior, com a diferença de que, desta feita, se pretende uma transferência de mais de 19,7 milhões de euros no período de um decénio, destinada a suportar os encargos com a limpeza urbana.

Tirando o Contrato-Programa e os anexos I e II, a documentação de suporte é idêntica, destacando-se o chamado Estudo de Viabilidade Económica e Financeira e Trajectória Tarifária do Contrato de Gestão Delegada, que é exactamente o mesmo Estudo que suporta a decisão anterior. Nada acrescenta e pelos vistos pouco importa.

Por outras palavras, não há nada que sustente que o actual modelo é melhor, mais eficiente e mais vantajosa do que o regresso das operações de limpeza à esfera directa do Município. 

Disse.