segunda-feira, 29 de junho de 2020

CDU contra novo regulamento dos resíduos

Acesso ao serviço de gestão de resíduos tem de ser universal e em condições iguais para todos

A CDU defendeu, na sessão desta segunda-feira da Assembleia Municipal, que deve ser garantido a todos os munícipes o serviço de recolha de resíduos e criticou a forma com está a ser introduzido um novo sistema tarifário para cobrar os lixos indiferenciados 



Intervenção de Alfredo Maia

Na senda da intervenção da CDU abordando esta matéria na sessão de 17 de Fevereiro, a recolha transporte, encaminhamento e tratamento e valorização adequados e ambientalmente sustentáveis constituem um direito das populações como serviço público universal e não um negócio.

Nesse sentido, manifestamos a nossa discordância em relação ao “princípio da promoção tendencial da universalidade e da igualdade de acesso” à prestação do serviço de gestão de resíduos que a proposta visa estabelecer (Cfr. Art.º 10.º, al. a)).

O que o Regulamento deve consagrar sem margem para ambiguidades é o princípio da garantia da universalidade e da igualdade de acesso a tal serviço. Por esta razão, propomos a eliminação da expressão “tendencial”.

Manifestamos também as maiores reservas à terminologia empregue nalguma literatura técnica e de orientação de políticas públicas, incluindo a publicada pela Entidade Reguladora dos Serviços de Águas e Resíduos (ERSAR), e que nesta proposta de Regulamento está vertida.

Trata-se do chamado princípio do “poluidor-pagador”, que nem sequer é o de utilizador-pagador, conceitos que a Lei de Bases do Ambiente (Lei n.º 19/2014) distingue claramente, ao estabelecer os princípios materiais do ambiente a que a administração pública está subordinada (Cfr. Art.º 3.º), a saber:

d) Do poluidor-pagador, que obriga o responsável pela poluição a assumir os custos tanto da atividade poluente como da introdução de medidas internas de prevenção e controle necessárias para combater as ameaças e agressões ao ambiente;
e) Do utilizador-pagador, que obriga o utente de serviços públicos a suportar os custos da utilização dos recursos, assim como da recuperação proporcional dos custos associados à sua disponibilização, visando a respetiva utilização racional;

Certamente que não se pretende tratar munícipes como malfeitores que poluem. Na verdade o que se espera deles – dos utilizadores – é, simplesmente, que entreguem ao sistema municipal de recolha os resíduos produzem, da forma como o sistema determinar – o sistema e não eles.
Assim, propomos que a figura do poluidor-pagador seja substituída pela do utilizador-pagador.

Com esta proposta, pretende o Executivo introduzir um novo sistema tarifário, assente, por um lado, numa taxa fixa pela mera disponibilidade do serviço, e, por outro, numa componente variável que poderá ser cobrada segundo duas metodologias distintas (Cfr. Art.º 65.º).
  • Uma corresponde à indexação da tarifa ao consumo de água em vigor há muitos anos (n€ x m3).
  • A outra traduz-se no pagamento de um custo imputado pela quantidade de resíduos indiferenciados (os não separados para reciclagem). É o sistema designado PAYT – pay as you throuw, pague o que rejeita.

Quatro objecções fundamentais se levantam desde já:

1.ª – A coexistência de duas metodologias de determinação do valor da componente variável da tarifa contende com as garantias de equidade de tratamento dos utilizadores e com o princípio da repartição equitativa dos custos pelos utentes, já que uns pagarão o mesmo serviço de forma diferente de outros.

2.ª – O facto de constarem na estrutura tarifária (Anexo II) distintos métodos de cálculo da tarifa PAY – volume, peso, saco, selos… – põe em causa os princípios da clareza, transparência e previsibilidade. Um Regulamento deve fixar apenas um método claro e igual para todos.

3.ª – Se o sistema PAYT ainda se encontra em estudo num projecto-piloto, seria prudente esperar pelas suas conclusões e das orientações técnicas que dele resultarão, antes de introduzi-lo no Regulamento.

4.ª – Subsistem muitas incertezas relativamente ao modo justo de aplicar o tarifário PAYT nos casos dos edifícios de habitação colectiva, pois subsistem incertezas quanto ao modo de calcular com rigor a produção de cada um dos condóminos que utilizam equipamentos colectivos de deposição (contentores).

Acresce que a própria introdução do sistema PAYT já vem tarde e é contraditória com o objectivo de valorização ambiental dos bio-resíduos, que representam cerca de 37% da média dos resíduos urbanos em Portugal.

Estando Portugal obrigado a cumprir, a partir de 2023, metas de valorização dos bio-resíduos, que deixarão de ser considerados indiferenciados, devendo geridos em fluxo específico, à semelhança do que sucede com as embalagens, o papel e cartão, o vidro, etc., não se justifica a necessidade de tal sistema.

Por conseguinte, propomos a eliminação das referências ao sistema PAYT no presente projecto, devendo ser aprofundados estudos com vista à abordagem regulamentar e tarifária dos resíduos realmente indiferenciados que venham a restar.

Disse.