quarta-feira, 26 de junho de 2019

CDU contra transferência de competências

Câmara não esclarece que condições tem para receber novas competências


Graças à intervenção da CDU, a Câmara Municipal da Maia apresentou à Assembleia Municipal uma proposta para a não aceitação, em 2020, da maior parte das transferências de competências aprovadas pelo Governo. No entanto, propôs a aceitação de outras, em relação às quais a CDU discordou, por o Município não estar preparado para as receber e porque, como o PCP e a coligação têm defendido, estamos perante uma transferência de encargos e não uma verdadeira descentralização, que só será possível com a regionalização.


A intervenção da CDU traduziu-se, em primeiro lugar, na advertência, com a antecedência suficiente, de que a a Assembleia deveria tomar posição, na sessão desta quarta-feira  sobre a transferência de competências com efeitos em 2020, pois a lei-quadro da chamada descentralização impõe que a não aceitação seja comunicada até ao dia 30 deste mês. Se não o fizerem, significa que as autarquias as aceitam todas. 

Em coerência com as suas posições e prática, especialmente nas autarquias governadas pela CDU, o nosso Grupo Municipal também tomou a iniciativa de entregar na Mesa da Assembleia Municipal uma proposta de deliberação, com o objectivo de rejeitar todas as competências.

Na sequência dos alertas e da iniciativa da CDU, o Executivo municipal reuniu-se em sessão extraordinária, de modo a fazer aprovar uma proposta própria a tempo de ser introduzida na mesma sessão.

Tendo ambas as propostas sido levadas a discussão e votação, depois de admitidas pelo plenário da Assembleia, a bancada da maioria que suporta a Câmara Municipal (PSD/CDS - "Maia em Primeiro") teve de fazer aprovar a proposta do Executivo, votando assim contra a da CDU.

Embora estando de acordo que o Município deveria rejeitar as competências que a Câmara também entendia não aceitar, os eleitos da CDU discordaram da aceitação de outras. Por isso se abstiveram na votação, justificando claramente a sua posição.

A seguir: a intervenção da CDU na Assembleia Municipal e a proposta apresentada pela bancada. 


Intervenção de Alfredo Maia

Começamos por lamentar as condições em que é feita a discussão da complexa e armadilhada pretensa descentralização de competências para o Município, que mais não é do que uma transferência de encargos, com graves riscos para a qualidade dos serviços públicos, a garantia de acesso universal e a preservação das funções do Estado.

De facto, o Executivo deveria saber, desde a publicação da Lei n.º 50/2018, de 16 de Agosto, isto é, há já mais de dez meses, que tinha um prazo até ao próximo dia 30, ou seja, daqui a quatro dias, para comunicar que não aceitará a transferência, em 2020, de determinado conjunto de competências para o Município.

Passe a presunção, foi necessário que a CDU levantasse o problema da necessidade de tal pronunciamento nesse prazo, na reunião da Mesa e de líderes do passado dia 17, apresentando uma iniciativa nesse sentido logo no início da manhã do dia seguinte, para que a Câmara despertasse para as obrigações que lhe cabem.

E não colhe, Senhor Presidente da Câmara, a alegação de que V. Exa. e o Executivo aguardavam a todo o instante um diploma do Governo para o adiamento do prazo para 30 de Setembro.

Desde logo, porque qualquer alteração designadamente aos prazos previstos na Lei n.º 50/2018 só poderá ser feita pela própria Assembleia da República.

Mas também, Senhor Presidente e senhores deputados, porque não há qualquer margem para dúvidas de que nem em Setembro esta Câmara estará em condições de receber o lote de competências previsto daquela lei, assim como restarão poucas sobre se tais condições estarão reunidas para se aceitar aquelas que o Executivo aqui vem propor que sejam transferidas em 2020.

São elas, recordemos, as relativas aos jogos de fortuna e azar, às associações de bombeiros no que tange às funções de protecção civil, ao património sem uso, ao estacionamento público, à protecção, saúde animal e segurança alimentar, bem como a cultura.

Pois bem, 

Estará o Senhor Presidente da Câmara em condições de assegurar-nos que, até ao início do próximo ano – e até antes, na elaboração do Plano e do Orçamento – , o Município preencherá todos os requisitos científicos, técnicos, humanos, materiais e financeiros exigíveis, ou pelo menos qualitativamente aceitáveis, em ordem a receber tais competências?

Saberá dizer a esta Assembleia, a este órgão deliberativo e fiscalizador, de quantos funcionários, com distintos níveis de qualificação e competências, necessita o Município de dotar-se para o efeito, seja recebendo-os de departamentos da Administração Central, seja recrutando-os de raiz?

Saberá dizer a esta Assembleia que reconfiguração – e em que prazo – vai ser necessária na macro-estrutura do Município?

Saberá enfim dizer-nos – e só para encurtarmos razões – qual vai ser o impacto orçamental da aceitação de competências aqui proposta?

A CDU é seguramente o único grupo municipal desta Assembleia que sempre tem defendido, com toda a determinação, a necessidade de uma discussão muito séria – e seriamente integrada num processo muito mais amplo que terá forçosamente de passar pela regionalização – que acautele as funções sociais do Estado, a igualdade e a universalidade do acesso a direitos e serviços e as legítimas aspirações dos eleitos locais a uma transformação democrática e transformadora das relações das administrações com os cidadãos.

Por isso, embora acompanhe o propósito, mas não as razões, da rejeição do conjunto de competências em 2020 identificado na proposta, não apoia a intenção de aceitar as outras.


Disse.


PROPOSTA DE DELIBERAÇÃO APRESENTADA PELA CDU


ASSUNTO: Lei-quadro da transferência de competências para as autarquias locais e para as entidades intermunicipais – Não aceitação pelo Município da Maia da transferência de competências em 2020- Comunicação à Direcção-Geral das Autarquias Locais nos termos previstos na alínea b) do n.º 2 do Art.º 4.º da Lei n.º 50/2018, de 16 de Agosto 


Considerando que: 

1. A Lei n.º 50/2018, de 16 de Agosto estabelece o quadro da transferência de competências para as autarquias locais e para as entidades intermunicipais, vindo a ser desenvolvido numa série de diplomas sectoriais. 

2. Por deliberação da Assembleia Municipal da Maia, na sessão de 14 de Setembro de 2018, decidiu o Município não aceitar a transferência de competências no ano de 2019, comunicando-o à Direcção-Geral das Autarquias Locais, nos termos do estabelecido na alínea a) do n.º 2 do art.º 4.º do referido diploma. 

3. Os diplomas sectoriais que, nos termos da Lei n.º 50/2018, deveriam ter sido publicados até 15 de Setembro de 2018, foram-no nos últimos sete meses, isto é, entre novembro de 2018 e maio de 2019. 

4. No decurso dos últimos meses, veio a Assembleia Municipal a rejeitar transferência de competências estabelecidas nesses diplomas nos mais variados sectores, designadamente por entender não estarem garantidas as condições financeiras, materiais e organizações em ordem à assunção responsável das competências e responsabilidade nos respectivos diplomas legais, para além das opiniões, diversas nalguns casos, incluindo a rejeição de princípio à transferência de competências em áreas específicas, dos diferentes Grupos Municipais sobre cada uma delas. 


Considerando ainda que: 

5. A Lei n.º 50/2018 concede às autarquias a faculdade de optarem por adiar o exercício das novas competências por deliberação dos seus órgãos deliberativos, comunicando a sua opção à Direção-Geral das Autarquias Locais, até 30 de junho de 2019, no caso de não pretenderem a transferência no ano de 2020. 

6. Não estão alterados os pressupostos dos fundamentos da decisão, de 14 de Setembro de 2018, de não aceitar a transferência de competências em 2019, bem como das deliberações sobre os diplomas sectoriais já tomadas. 

7. Por outro lado, o Município da Maia considera que o processo de descentralização administrativa deve ser devidamente ponderado, fundamentado e enquadrado num processo mais vasto e consistente de definição de competências nos diversos níveis de administração – central, regional e local – garantindo o exercício do poder público e observando os princípios da solidariedade nacional, da coesão territorial, da preservação das funções do Estado, da autonomia das regiões e das autarquias e da justa repartição de recursos financeiros, 


A Assembleia Municipal da Maia, no exercício da competência prevista na alínea k) do n.º 2 do Art.º 25.º da Lei n.º 75/2013, de 12 de Setembro, e ao abrigo do disposto na alínea b) do n.º 2, do artigo 4.º da Lei n.º 50/2018, de 16 de Agosto, a Assembleia Municipal da Maia delibera: 

a) que não pretende, no ano de 2020, a transferência das competências enunciadas na Lei n.º 50/2018, de 16 de Agosto, e referidas nos diplomas sectoriais publicados em concretização desta Lei; e 

b) que esta deliberação seja comunicada à Direção-Geral das Autarquias Locais, até 30 de Junho de 2019. 


Maia e Paços do Concelho, 26 de Junho de 2019. 


O Grupo Municipal CDU